08/07/2016 | Fonte: Por Naiara Araújo / Successful Farming Brasil

Desperdício leva 1,3 milhão de toneladas de alimentos para o lixo por ano

Desperdício leva 1,3 milhão de toneladas de alimentos para o lixo por ano
Foto: Successful Farming Brasil

A população mundial desperdiça 1,3 milhões de toneladas de alimentos por ano. Na América Latina, todos os dias são desperdiçadas 348 mil toneladas, de acordo com dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Segundo as estimativas da FAO, com o volume de alimentos desperdiçados por ano na região latino-americana seria possível alimentar 37% das pessoas que passam fome no mundo. Essas estatísticas preocupam os setores ligados à produção e direcionam políticas de combate a fome, sendo que uma das metas é reduzir pela metade o desperdício per capita na América Latina em 2025.

Para alcançar a meta, uma das soluções é conscientizar o consumidor. Para Camila Kneip, coordenadora de nutrição da ONG Banco de Alimentos, a fome no Brasil não é levada a sério devido à abundância de alimentos que existe no País. “Há um descaso enorme em relação aos recursos, que todos sabemos ser limitados, o que se traduz em uma grande irresponsabilidade individual e coletiva”, diz a coordenadora. “Infelizmente existe uma cultura de consumo exagerado, muitas vezes baseada no conceito de que ‘é melhor sobrar do que faltar’, o que corrobora para o aumento dos números relativos ao desperdício.”

É preciso esclarecer a doação de alimentos

Um das dificuldades encontradas na área de doações de alimentos é a desinformação. Ainda hoje, muitas pessoas acreditam que existe uma lei que proíbe a doação de alimentos no Brasil. Mas, segundo Camila Kneip, isso não é real. “O que ocorre, na verdade, é que não existe uma lei que proteja o doador de uma possível ação civil ou criminal, caso haja uma queixa de intoxicação”, diz Camila. “Este fato faz com que a maioria dos possíveis doadores opte por jogar fora os alimentos ou incinerá-los, a doá-los”.

No caso do Banco de Alimentos, a ONG inspeciona todos os produtos recebidos e, ao verificar que estão em perfeitas condições para o consumo, fica responsável pela doação. “Com esse procedimento demonstramos, na prática, que este tipo de atuação é possível e faz grande sentido”, diz Camila. O Banco de Alimentos recebe doação de alimentos in natura, industrializado, refrigerados, congelados e não perecíveis. Os principais doadores são supermercados, hortifrútis, empresas e indústrias produtoras de alimentos, padarias, produtores rurais e pessoas físicas. Por ano, a instituição arrecada cerca de 360 toneladas de alimentos, que beneficiam 22 mil pessoas.

A Ceagesp também atua contra o desperdício

Também com o objetivo reduzir o desperdício, o banco de alimentos da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) recebe produtos que não chegariam aos mercados com qualidade para o consumo e que, provavelmente, seriam descartados. Jae Young, coordenador de sustentabilidade da Ceagesp, explica que os produtos devem ficar maduros só quando já estão no varejo porque se chegarem ao atacado prontos para o consumo, há grandes chances de serem desperdiçados. “Se o supermercado compra o material maduro, até ele levar para o ponto de venda e ficar uma semana tentando vender, esse alimento passa do ponto”, diz Young.

Geralmente, por mês, o banco de alimentos recebe entre 150 e 200 toneladas de frutas, legumes e verduras, que são doadas pelos produtores e distribuidores da Companhia. Além dessas doações, cargas ilegais ou com notas extraviadas também são entregues para o banco de alimentos da Ceagesp. Após passar por análise nutricional, esses produtos têm como destino 150 entidades sociais cadastradas. “Essa ação é importante porque evita o desperdício dentro do entreposto e aproveita os produtos para a alimentação. Nossa meta é chegar ao desperdício zero”, diz Young. Segundo ele, geralmente, os produtos mais doados são legumes como tomate, batata, cenoura e berinjela. No caso das frutas, as principais são caqui, laranja e banana.

Quando uma entidade se cadastra, os responsáveis pelo banco de alimentos avaliam a cozinha da instituição e a experiência das cozinheiras. “A gente dá uma ajuda inicial”, diz o coordenador de sustentabilidade. “Nós ensinamos como manipular e como reaproveitar o alimento.” A Companhia planeja ampliar o projeto no segundo semestre de 2016 com a inauguração de uma cozinha experimental. Esse espaço será usado para ministrar cursos sobre nutrição e preparo de alimentos.

Rejeição de alimentos “feios” gera desperdícios

Outro comportamento que intensifica o desperdício de alimentos é a estética. Muitas vezes, o alimento apresenta boas condições para consumo, mas é rejeitado pelo consumidor por ser considerado “feio”. “Precisamos educar a população para o fato de que má aparência não significa pior conteúdo nutricional, salvo se o alimento estiver estragado”, afirma a coordenadora Camila Kneip.

No caso do banco de alimentos da Ceagesp, o que vale são as características nutricionais. “Aqui nós olhamos a qualidade. Às vezes o tomate pode estar feio, mas próprio para o consumo. Quando ele realmente apodrece, vai para o lixo, mas a nossa avaliação é nutricional”, diz o coordenador de sustentabilidade Jae Young.

Uso de cascas e sementes

Outro problema identificado pela ONG Banco de alimentos é o preconceito com as partes não convencionais do alimento, como cascas, entrecascas, folhas, talos e sementes. “São normalmente descartadas sem que as pessoas associem esse descarte como um desperdício”, diz Camila. A instituição acredita que o Aproveitamento Integral dos Alimentos (AIA) é uma das melhores e mais saudáveis maneiras de combater o desperdício. “Isso significa eliminar alguns preconceitos alimentares, como o de que esse tipo de alimentação é somente para população de baixa renda.”

Desperdício do campo à mesa

A solução para o problema exige conscientização do consumidor, mas também mudanças nas etapas de produção e comercialização. De acordo com informações da Embrapa, 10% do desperdício de alimentos brasileiros acontece no campo, 50% durante o manuseio e transporte, 30% na fase de comercialização e abastecimento e apenas 10% é de responsabilidade do varejo e do consumidor final.

Segundo a ONG Banco de Alimentos, o desperdício no campo acontece principalmente por causa de técnicas inadequadas de plantio e uso excessivo de defensivos. Na fase pós-porteira, o transporte inadequado é o responsável por estragar os alimentos. No atacado e varejo, tanto o manuseio como o armazenamento inadequado podem provocar o desperdício. Já nos lares brasileiros, os erros são outros. “O consumidor não planeja a quantidade de alimentos a ser comprada, não os armazena corretamente, prepara mais do que consome e descarta partes não convencionais como cascas, folhas talos e sementes”, diz a coordenadora da ONG Banco de Alimentos.

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